domingo, 5 de junho de 2011

Pela liberdade de ter uma calça jeans !

Eu sei. Os stalinistas mais ortodoxos gostam de dizer que o feminismo é uma pauta liberal que só serve aos interesses do capital e obscurece a luta de classes. Os marxistas mais "classicos" dizem que os movimentos sociais pautados em lutas por reconhecimento e identidade , na verdade, são  lutas que só atrapalham o processo de formação da identidade de classe. Os pós-modernos dizem que não há gênero, nem luta, nem política. Os liberais dizem que nossa luta é legal e deve ser respeitada, mas continuam nos dando os piores salarios, precarizando nossos contratos e nos impedindo de ocupar posições de decisão. A luta feminista é uma luta árdua, quase sem aliados. 

Pois bem, hoje quero travar uma luta que aparentemente é superficial por se tratar de uma luta dentro dos marcos do consumismo moderno.  Para aqueles críticos que acreditam na pureza do gosto e do senso estetico, para os estetas que defendem a transcedencia contra os problemas mundanos do mercado – ei, escola de Frankfurt -  gritemos: Quem não desce pro mundo, não faz revolução.

Então nós descemos. Vamos ao shopping, este espaço paradigmatico da sociedade moderna de consumo onde todas as coisas se colocam acessiveis e disponiveis para atender nossos desejos, desde que você tenha condições materiais para tê-las, nem que para isso você tenha que parcelar e parcelar sua compra, uma mágica matematica que te torna mais rico inexplicavelmente. Este espaço da liberdade de mercado, se olharmos de perto, diriamos: tão livre quanto é a liberdade que o trabalhador possui de vender sua força de trabalho. ( Essa foi para os classico! )

No entanto, nada é tão simples quanto parece ser quando se quer comprar uma calça jeans. Sim, o jeans, esse simbolo do american way of life, o mais democratico dos signos da moda, o jeans que surge como o material fundamental dos uniformes de mineradores do século XIX e hoje é esse misterioso elemento do vestuario que pode ser simples e sofisticado ao mesmo tempo, que pode custar vinte ou oitocentos reais, dependendo do ponto de vista.

Era só uma calça jeans. Dessas que você pode usar para trabalhar ou ir para a faculdade ou ir à um restaurante chique no leblon ou ir ao médico, à farmacia. Levi Strauss diria que o jeans é um significante flutuante, que não possui um significado fixo, mas que tem um potencial significativo enorme e variado, nunca se estabiliza, está sempre disponível para novos sentidos. Pois bem, era só uma calça jeans, não era pra ser uma odisséia semiótica.

Primeiro porque descubro ser especialmente dificil encontrar uma peça destas que simplesmente seja simples. Sem brilhos, sem rasgos, sem etiquetas prateadas, por favor, queria um jeans com cor de jeans, sem detalhes sórdidos, pode ser ? Dificil.  O mais dificil ainda estava por vir: descubro que estamos em plena ditadura cruel e sanguinaria da calça skinny. Sim, aquela calça mais justa do que a roupa de um mergulhador, que alias fica muito bem em mulheres que possuem uma composição equilibrada de bunda, coxas e panturrilhas, digo, que nenhum destes elementos seja dominante do ponto de vista dimensional. Não conheço muitas mulheres destas, a maioria delas é  adepta à estetica surrelaista ou expressionista do ponto de vista da forma, ou seja : formas perfeitas é coisa do passado. Mulheres de vanguarda, eu diria.  

Passando pelo imperio quase invencivel dos detalhes, pela ditadura quase fascista das skinnys, chegamos então ao problema do tamanho. O que uma loja quer dizer quando expoe em seu mostruário todas as calças no tamanho 36? Eu sei o que ela quer dizer : Se você não é suficientemente magra para entrar nessas calças e então não merece estar aqui ocupando esse espaço. Se você não é suficientemente esbelta e elegante para entrar em uma calça jeans de numero trinta e pouco, então, você não é digna, não merece respeito.

Olha, vou dizer : vocês que acreditaram na liberdade do mercado liberal, nunca foram comprar uma calça jeans. O mercado não é esse oásis onde tudo pode desde que se tenha dinheiro. Não. Ele é mau. Ele nos quer magras. Ele nos quer 38.  Ele nos convence de que é preciso usar uma calça terrivelmente apertada e de que é preciso pagar muito caro pra ter a bexiga pressionada. Chegou o tempo de queimarmos calças jeans nas praças. Logo o jeans, um dominio livre da ditadura dos padrões de beleza, era nosso oásis, transgressor e ao mesmo tempo honestamente basico. O capital não tem limites. Já chega pra mim !

Pelo direito de vestir calças jeans com liberdade. Pelo direito de não pagar três digitos por isso. Pelo direito de possuir formas de picasso contra o fascismo das formas perfeitas !

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